A Lei 11.340 Maria da Penha
Roberto da Silva Rocha, professor
universitário e cientista político
Introdução
A estupidez
humana não tem limites.
Consegue me
surpreender sempre.
Como seria
possível reduzir as estatísticas da violência contra as mulheres?
Não consigo
imaginar isso!
Segundo os
dados do Ministério da justiça os assassinatos das mulheres atingiram a
incrível e catastrófica cifra de 6,12 mulheres por cada cem mil habitantes no
Brasil!
Quando
consideramos que no Brasil cerca de 49,9 assassinatos são cometidos por cada
grupo de cem mil habitantes, e que cerca de 37,1 assassinatos de homens negros são
cometidos para cada grupo de cem mil habitantes você pensa o quão absurda é a
lei Maria da Penha!
Na
Noruega, Suécia ou Dinamarca esta é a ordem de grandeza dos assassinatos cerca
de 0,5% ou 5 para cada cem mil habitantes. Precisamos de uma Lei Maria da Penha
a favor dos homicídios dos homens contra eles mesmos para baixarmos para o
índice das mulheres brasileira assassinadas.... Pelo amor de Deus, isto é histeria
coletiva e propaganda enganosa... Sai dessa, vamos ser honestos, não se briga
com os números!
Peço a condenação de todos os homens pelas continuadas violações cometidas
contra as mulheres, principalmente estabelecendo por mais de 10 mil anos uma supremacia
tal que tem hegemonicamente excluído a mulher de qualquer iniciativa importante
para a humanidade.
Os homens criaram praticamente tudo que existe na vida moderna sem permitir a
menor participação feminina, pois criaram, entre outras coisas:
Submarino;
Navio a vapor
Aviões
Automóveis
Computador
Sistemas Operacionais digitalizados e analógicos para dispositivos
computadorizados
Helicópteros
hélice
Geradores elétricos
Solda Elétrica
Caneta esferográfica
Máquina de lavar roupa
Secadores de cabelo
Chapinha elétria de cerámica
Microprocessadores de semicondutor
Inventaram, descobriram a Física,
Química
Matemática
Geografia
Filosofia
Psicologia
Medicina
Antropologia
Sociologia
Astronáutica
Astrologia
Engenharias
e enfim, não deixaram quase nada para as mulheres descobrirem ou
inventarem.
Este fato deixou as mulheres em uma situação tal que as mesmas encontram-se sem
condições de provarem as suas qualidades intelectuais por total ausência de
qualquer oportunidade deixada pelos machos.
É por isso que pessoas como Maria da Penha sofreram agressões durante quase uma
década (de 1983 até 1993) pelo seu marido e sem poder se afastar dele,
permitiu que o seu sofrimento se prolongasse até que o mesmo fosse afastado do
seu lado pelo divórcio.
As mulheres precisam ser tuteladas, cuidadas, conduzidas por que a opressão do
macho não permite que elas crescam e elas são incapazes de romperem esta
dependência total do macho, intelectualmente, fisicamente, economicamente e
sentimentalmente.
RELATÓRIO ANUAL 2000
RELATÓRIO N° 54/01*
CASO 12.051 / OEA
MARIA DA PENHA MAIA FERNANDES
BRASIL
4 de abril de 2001
I. RESUMO
1. Em 20 de agosto de 1998, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos
(doravante denominada “a Comissão”) recebeu uma denúncia apresentada pela
Senhora Maria da Penha Maia Fernandes, pelo Centro pela Justiça e pelo Direito
Internacional (CEJIL) e pelo Comitê Latino-Americano de Defesa dos Direitos da
Mulher (CLADEM) (doravante denominados “os peticionários”), baseada na
competência que lhe conferem os artigos 44 e 46 da Convenção Americana sobre
Direitos Humanos (doravante denominada “a Convenção” ou “a Convenção Americana)
e o artigo 12 da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a
Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará ou CVM).
2. A denúncia alega a tolerância da República Federativa do Brasil (doravante
denominada “Brasil” ou “o Estado”) para com a violência cometida por Marco
Antônio Heredia Viveiros em seu domicílio na cidade de Fortaleza, Estado do
Ceará, contra a sua então esposa Maria da Penha Maia Fernandes durante os anos
de convivência matrimonial, que culminou numa tentativa de homicídio e novas
agressões em maio e junho de 1983. Maria da Penha, em decorrência dessas
agressões, sofre de paraplegia irreversível e outras enfermidades desde esse
ano. Denuncia-se a tolerância do Estado, por não haver efetivamente tomado por
mais de 15 anos as medidas necessárias para processar e punir o agressor,
apesar das denúncias efetuadas. Denuncia-se a violação dos artigos 1(1)
(Obrigação de respeitar os direitos); 8 (Garantias judiciais); 24 (Igualdade
perante a lei) e 25 (Proteção judicial) da Convenção Americana, em relação aos
artigos II e XVIII da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem
(doravante denominada “a Declaração”), bem como dos artigos 3, 4,a,b,c,d,e,f,g,
5 e 7 da Convenção de Belém do Pará. A Comissão fez passar a petição pelos
trâmites regulamentares. Uma vez que o Estado não apresentou comentários sobre
a petição, apesar dos repetidos requerimentos da Comissão, os peticionários
solicitaram que se presuma serem verdadeiros os fatos relatados na petição
aplicando-se o artigo 42 do Regulamento da Comissão.
3. A Comissão analisa neste relatório os requisitos de admissibilidade e
considera que a petição é admissível em conformidade com os artigos 46(2)(c) e
47 da Convenção Americana e o artigo 12 da Convenção de Belém do Pará. Quanto
ao fundo da questão denunciada, a Comissão conclui neste relatório, elaborado
segundo o disposto no artigo 51 da Convenção, que o Estado violou, em prejuízo
da Senhora Maria da Penha Maia Fernandes, os direitos às garantias judiciais e
à proteção judicial assegurados pelos artigos 8 e 25 da Convenção Americana, em
concordância com a obrigação geral de respeitar e garantir os direitos,
prevista no artigo 1(1) do referido instrumento e nos artigos II e XVII da
Declaração, bem como no artigo 7 da Convenção de Belém do Pará. Conclui também
que essa violação segue um padrão discriminatório com respeito a tolerância da
violência doméstica contra mulheres no Brasil por ineficácia da ação judicial.
A Comissão recomenda ao Estado que proceda a uma investigação séria, imparcial
e exaustiva para determinar a responsabilidade penal do autor do delito de
tentativa de homicídio em prejuízo da Senhora Fernandes e para determinar se há
outros fatos ou ações de agentes estatais que tenham impedido o processamento
rápido e efetivo do responsável; também recomenda a reparação efetiva e pronta
da vítima e a adoção de medidas, no âmbito nacional, para eliminar essa
tolerância do Estado ante a violência doméstica contra mulheres.
II. TRAMITAÇÃO PERANTE A COMISSÃO E OFERECIMENTO DE SOLUÇÃO AMISTOSA
4. Em 20 de agosto de 1998, a Comissão Interamericana recebeu a petição
relativa ao caso e, em 1º de setembro do mesmo ano, enviou notificação aos
peticionários acusando o recebimento de sua denúncia e informando-lhes que
havia sido iniciada a tramitação do caso. Em 19 de outubro de 1998, a Comissão
Interamericana transmitiu a petição ao Estado e solicitou-lhe informações a
respeito da mesma.
5. Ante a falta de resposta do Estado, em 2 de agosto de 1999, os peticionários
solicitaram a aplicação do artigo 42 do Regulamento da Comissão com o propósito
de que se presumisse serem verdadeiros os fatos relatados na denúncia, uma vez
que haviam decorrido mais de 250 dias desde a transmissão da petição ao Brasil
e este não havia apresentado observações sobre o caso.
6. Em 4 de agosto de 1999, a Comissão reiterou ao Estado sua solicitação de
envio das informações que considerasse pertinentes, advertindo-o da
possibilidade de aplicação do artigo 42 do Regulamento.
7. Em 7 de agosto de 2000, a Comissão se colocou à disposição das partes por 30
dias para dar início a um processo de solução amistosa de acordo com os artigos
48.1,f da Convenção e 45 do Regulamento da Comissão, sem que até esta data
tenha sido recebida resposta afirmativa de nenhuma das partes, motivo por que a
Comissão considera que, nesta etapa processual, o assunto não é suscetível de solução
por esse meio.
III. POSIÇÕES DAS PARTES
A. Posição dos peticionários
8. De acordo com a denúncia, em 29 de maio de 1983, a Senhora Maria da Penha
Maia Fernandes, de profissão farmacêutica, foi vítima, em seu domicílio em
Fortaleza, Estado do Ceará, de tentativa de homicídio por parte de seu então
esposo, Senhor Marco Antônio Heredia Viveiros, de profissão economista, que
disparou contra ela um revólver enquanto ela dormia, ato que culminou uma série
de agressões sofridas durante sua vida matrimonial. Em decorrência dessa
agressão, a Senhora Fernandes sofreu várias lesões e teve de ser submetida a
inúmeras operações cirúrgicas. Em conseqüência da agressão de seu esposo, ela
sofre de paraplegia irreversível e outros traumas físicos e psicológicos.[1]
9. Os peticionários indicam que o temperamento do Senhor Heredia Viveiros era
agressivo e violento e que ele agredia sua esposa e suas filhas durante o tempo
que durou sua relação matrimonial, situação que, segundo a vítima, chegou a ser
insuportável, pois não se atrevia, por temor, a tomar a iniciativa de
separar-se. Sustenta ela que o esposo procurou encobrir a agressão alegando ter
havido uma tentativa de roubo e agressão por parte de ladrões que teriam
fugido. Duas semanas depois de a Senhora Fernandes regressar do hospital, e
estando ela em recuperação, pela agressão homicida de 29 de maio de 1983,
sofreu um segundo atentado contra sua vida por parte do Senhor Heredia
Viveiros, que teria procurado eletrocutá-la enquanto se banhava. Nesse ponto, decidiu
separar-se dele judicialmente.[2]
10. Asseguram que o Senhor Heredia Viveiros agiu premeditadamente, pois semanas
antes da agressão tentou convencer a esposa de fazer um seguro de vida a favor
dele e, cinco dias antes de agredi-la, procurou obrigá-la a assinar um
documento de venda do carro, de propriedade dela, sem que constasse do
documento o nome do comprador. Indicam que a Senhora Fernandes posteriormente
se inteirou de que o Senhor Viveiros tinha um passado de delitos, era bígamo e
tinha um filho na Colômbia, dados que não revelara à esposa.
11. Acrescentam que, em virtude da paraplegia resultante, a vítima deve ser
submetida a múltiplos tratamentos físicos de recuperação, além de se achar em
grave estado de dependência, que faz com que necessite da ajuda constante de
enfermeiros para que se possa mover. Tais despesas permanentes com medicamentos
e fisioterapeutas são altas e a Senhora Maria da Penha não recebe ajuda
financeira por parte do ex-esposo para custeá-las. Tampouco efetua ele os pagamentos
de pensão alimentar prescritos no juízo de separação.
12. Alegam os peticionários que, durante a investigação judicial, iniciada dias
depois da agressão de 6 de junho de 1983, foram recolhidas declarações que
comprovavam a autoria do atentado por parte do Senhor Heredia Viveiros, apesar
de este sustentar que a agressão fora cometida por ladrões que pretendiam
entrar na residência comum. Durante a tramitação judicial foram apresentadas
provas que demonstram que o Senhor Heredia Viveiros tinha a intenção de
matá-la, e foi encontrada na casa uma espingarda de sua propriedade, o que
contradiz sua declaração de que não possuía armas de fogo. Análises posteriores
indicaram que a arma encontrada foi a utilizada no delito. Com base em tudo
isso, o Ministério Público apresentou sua denúncia contra o Senhor Heredia
Viveiros em 28 de setembro de 1984, como ação penal pública perante a 1a. Vara
Criminal de Fortaleza, Estado do Ceará.
13. Os peticionários observam que, apesar da contundência da acusação e das provas,[3]
o caso tardou oito anos a chegar a decisão por um Júri, que em 4 de maio de
1991, proferiu sentença condenatória contra o Senhor Viveiros, aplicando-lhe,
por seu grau de culpabilidade na agressão e tentativa de homicídio, 15 anos de
prisão, que foram reduzidos a dez anos, por não constar condenação anterior.
14. Indicam que nesse mesmo dia, 4 de maio de 1991, a defesa apresentou um
recurso de apelação contra a decisão do Júri. Esse recurso, segundo o artigo
479 do Código Processual Penal brasileiro, era extemporâneo, pois somente podia
ser instaurado durante a tramitação do juízo, mas não posteriormente. Essa
impossibilidade legal é reiteradamente sustentada pela jurisprudência
brasileira e pelo próprio Ministério Público no caso em apreço.
15. Passaram-se outros três anos até que, em 4 de maio de 1995, o Tribunal de
Alçada decidiu da apelação. Nessa decisão, aceitou a alegação apresentada
extemporaneamente e, baseando-se no argumento da defesa de que houve vícios na
formulação de perguntas aos jurados, anulou a decisão do Júri.
16. Alegam que paralelamente se desenvolvia outro incidente judicial pela
apelação contra a sentença de pronúncia (primeira decisão judicial pela qual o
Juiz decide que há indícios de autoria que justiticam levar o caso ao Júri),
apelação que teria sido também extemporânea e que foi declarada como tal pelo
Juiz. Para o exame dessa decisão, também interposto recurso de apelação perante
o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, que aceitou considerar a apelação e a
rejeitou, confirmando em 3 de abril de 1995 a sentença de pronúncia, uma vez
mais reinstituindo que havia indícios suficientes de autoria.
17. A denúncia sobre a ineficácia judicial e a demora em ministrar justiça
continua a sustentar que dois anos depois da anulação da sentença condenatória
proferida pelo primeiro Júri, em 15 de março de 1996, realizou-se um segundo
julgamento pelo Júri em que o Senhor Viveiros foi condenado a dez anos e seis
meses de prisão.
18. Os peticionários manifestam que novamente o Tribunal aceitou uma segunda
apelação da defesa, em que se alegava que o réu foi julgado ignorando-se as
provas de autos. Desde 22 de abril de 1997, o processo se encontra à espera da
decisão do recurso em segunda instância perante o Tribunal de Justiça do Estado
do Ceará e, até a data da apresentação da petição à Comissão, não havia sido
decidido.
19. Alegam os peticionários que, na data da petição, a justiça brasileira havia
tardado mais de 15 anos sem chegar à condenação definitiva do ex-esposo da
Senhora Fernandes, que se mantivera em liberdade durante todo esse tempo,
apesar da gravidade da acusação e das numerosas provas contra ele e apesar da
gravidade dos delitos cometidos contra a Senhora Fernandes. Desse modo, o Poder
Judiciário do Ceará e o Estado brasileiro agiram de maneira ineficaz deixando
de conduzir o processo judicial de maneira rápida e eficiente, com isso criando
alto risco de impunidade, uma vez que a punição neste caso prescreve depois de
transcorridos 20 anos do fato, o que não demora a ocorrer. Sustentam que o
Estado brasileiro devia ter tido por principal objetivo a reparação das
violações sofridas por Maria da Penha, assegurando-lhe um processo justo num
prazo razoável.[4]
20. Sustentam que sua denúncia não representa uma situação isolada no Brasil e
que este caso é um exemplo do padrão de impunidade nos casos de violência
doméstica contra mulheres no Brasil, pois a maioria das denúncias não chegam a
converter-se em processos criminais e, dos poucos que chegam a ser processados,
somente uma minoria chega à condenação dos perpetradores. Recordam os termos da
própria Comissão quando defendeu em seu relatório sobre o Brasil o seguinte:
Os delitos incluídos no conceito de violência contra a mulher constituem uma
violação dos direitos humanos, de acordo com a Convenção Americana e os termos
mais específicos da Convenção de Belém do Pará. Quando os delitos são
perpetrados por agentes do Estado, o uso da violência contra a integridade
física e/ou mental de uma mulher ou de um homem são responsabilidade direta do
Estado. Ademais, o Estado tem a obrigação, de acordo com o artigo 1(1) da
Convenção Americana e o artigo 7,b da Convenção de Belém do Pará, de atuar com
a devida diligência a fim de prevenir as violações dos direitos humanos. Isso significa
que, embora a conduta não seja orginalmente imputável ao Estado (por exemplo,
porque o agressor é anônimo ou não é um agente do Estado), um ato de violação
pode acarretar responsabilidade estatal “não pelo ato em si, mas pela falta da
devida diligência para prevenir a violação ou a ela responder conforme requer a
Convenção.[5]
21. Alegam que o Estado não tomou medidas eficazes de prevenção e punição legal
da violência doméstica no Brasil, apesar de sua obrigação internacional de
preveni-la ou puni-la. Também apontam a situação de que os dados de homicídio e
violência sexual contra mulheres são perpetrados, na maioria dos casos, por
seus companheiros ou conhecidos.[6]
22. Alegam que, de acordo com seus compromissos internacionais, o Estado
brasileiro deveria agir preventivamente – e não o faz – para reduzir o índice
de violência doméstica, além de investigar, processar e punir os agressores
dentro de prazo razoável segundo as obrigações assumidas internacionalmente de
proteção dos direitos humanos. No caso da Senhora Fernandes, o Governo
brasileiro deveria ter procedido com o objetivo principal de reparar as
violações sofridas e de assegurar-lhe um processo justo contra o agressor
dentro de prazo razoável.
23. Consideram demonstrado que os recursos internos não foram efetivos para
reparar as violações dos direitos humanos sofridos por Maria da Penha Maia
Fernandes e, para agravar esse fato, a demora da justiça brasileira em chegar a
uma decisão definitiva, poderia acarretar em 2002 a prescrição do delito pelo
transcurso de 20 anos da sua perpetração, impedindo que o Estado exerça o jus
punendi e que o acusado responda pelo crime cometido. Essa ineficácia do Estado
também provoca a incapacidade da vítima de obter a reparação civil
correspondente.
24. Finalmente, os peticionários solicitaram a aplicação do artigo 42 do
Regulamento da Comissão, para estabelecer que se presuma a veracidade dos fatos
alegados na denúncia por não haver o Estado respondido, não obstante haverem
transcorridos mais de 250 dias desde a transmissão da denúncia ao Estado
brasileiro.
B. Posição do Estado
25. O Estado brasileiro não apresentou à Comissão resposta alguma com respeito
à admissibilidade ou ao mérito da petição, apesar das solicitações formuladas
pela Comissão ao Estado em 19 de outubro de 1998, em 4 de agosto de 1999 e em 7
de agosto de 2000.
IV. ANÁLISE SOBRE COMPETÊNCIA E ADMISSIBILIDADE
A. Competência da Comissão
26. Os peticionários sustentam que o Estado violou os direitos da vítima em
conformidade com os artigos 1(1), 8, 24 (em relação aos artigos II e XVIII da
Declaração Americana) e 25 da Convenção Americana (ratificada pelo Brasil em 25
de novembro de 1992) e os artigos 3, 4, 5 y 7 da Convenção de Belém do Pará
(ratificada em 27 de novembro de 1995), pelas violações cometidas a partir de
29 de maio de 1983 e, de maneira contínua, até o presente momento. Sustentam
que a falta de ação eficaz e a tolerância do Estado continuam mesmo sob a
vigência superveniente dessas duas Convenções Interamericanas.
27. A Comissão considera que tem competência ratione materiae, ratione loci e
ratione temporis por tratar a petição de direitos protegidos originalmente pela
Declaração Americana sobre os Direitos e Deveres do Homem, bem como pela
Convenção Americana e pela Convenção de Belém do Pará desde sua respectiva
vigência obrigatória com respeito à República Federativa do Brasil. Apesar de a
agressão original ter ocorrido em 1983, sob a vigência da Declaração Americana,
a Comissão, com respeito à alegada falta de garantias de respeito ao devido
processo, considera que, por se tratar de violações contínuas, estas seriam
cabíveis também sob a vigência superveniente da Convenção Americana e da
Convenção de Belém do Pará, porque a alegada tolerância do Estado a esse respeito
poderia constituir uma denegação contínua de justiça em prejuízo da Senhora
Fernandes que poderia impossibilitar a condenação do responsável e a reparação
da vítima. Conseqüentemente, o Estado teria tolerado uma situação de impunidade
e não-defensão, de efeitos perduráveis mesmo posteriormente à data em que o
Brasil se submeteu à Convenção Americana e à Convenção de Belém do Pará.[7]
28. Com relação à sua competência quanto à aplicação da Convenção
Interamericana para prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher,
“Convenção de Belém do para” (CVM), a Comissão tem competência em geral por se
tratar de um instrumento interamericano de direitos humanos, além da
competência que especificamente lhe conferem os Estados no artigo 12 da
referida Convenção, que diz o seguinte:
Qualquer pessoa ou grupo de pessoas, ou qualquer entidade não-governamental
juridicamente reconhecida em um ou mais Estados membros da Organização, poderá
apresentar à Comissão Interamericana de Direitos Humanos petições referentes a
denúncias ou queixas de violação do artigo 7 desta Convenção por um Estado
Parte, devendo a Comissão considerar tais petições de acordo com as normas e
procedimentos estabelecidos na Convenção Americana sobre Direitos Humanos e no
Estatuto e Regulamento da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, para a
apresentação e consideração de petições.
29. Com respeito à competência ratione personae, a petição foi apresentada
conjuntamente pela Senhora Maria da Penha Maia Fernandes, pelo Centro pela Justiça
e pelo Direito Internacional (CEJIL) e pela Comissão Latino-Americana de Defesa
dos Direitos da Mulher (CLADEM), todos eles habilitados para apresentar
petições à Comissão, de acordo com o artigo 44 da Convenção Americana. Ademais,
com relação ao Estado, de acordo com o artigo 28 da Convenção Americana, quando
se tratar de uma república federativa, como é o caso do Brasil, o governo
nacional responde na esfera internacional tanto por seus próprios atos como
pelos atos praticados pelos agentes das entidades que compõem a federação.
B. Requisitos de admissibilidade da petição
a) Esgotamento dos recursos da jurisdição interna
30. Segundo o artigo 46(1)(a) da Convenção, é necessário o esgotamento dos
recursos da jurisdição interna para que uma petição seja admissível perante a
Comissão. Entretanto, a Convenção também estabelece em seu artigo 46(2)(c) que,
quando houver atraso injustificado na decisão dos recursos internos, a
disposição não se aplicará. Conforme assinalou a Corte Interamericana, esta é
uma norma a cuja invocação o Estado pode renunciar de maneira expressa ou
tácita e, para que seja oportuna, deve ser suscitada nas primeira etapas do
procedimento, podendo-se na falta disso presumir a renúncia tácita do Estado
interessado a valer-se da mesma.[8]
31. O Estado brasileiro não respondeu às repetidas comunicações com as quais
lhe foi transmitida a petição e, por conseguinte, tampouco invocou essa
exceção. A Comissão considera que esse silêncio do Estado constitui, neste
caso, uma renúncia tácita a invocar esse requisito que o isenta de levar avante
a consideração de seu cumprimento.
32. Com maior razão, porém, a Comissão considera conveniente lembrar aqui o
fato inconteste de que a justiça brasileira esteve mais de 15 anos sem proferir
sentença definitiva neste caso e de que o processo se encontra, desde 1997, à
espera da decisão do segundo recurso de apelação perante o Tribunal de Justiça
do Estado do Ceará. A esse respeito, a Comissão considera, ademais, que houve
atraso injustificado na tramitação da denúncia, atraso que se agrava pelo fato
de que pode acarretar a prescrição do delito e, por conseguinte, a impunidade
definitiva do perpetrador e a impossibilidade de ressarcimento da vítima,
conseqüentemente podendo ser também aplicada a exceção prevista no artigo
46(2)(c) da Convenção.
b) Prazo para apresentação
33. De acordo com o artigo 46(1)(b) da Convenção Americana, a admissão de uma
petição está sujeita ao requisito de que seja apresentada oportunamente, dentro
dos seis meses subseqüentes à data em que a parte demandante tenha sido
notificada da sentença final no âmbito interno. Como não houve uma sentença
definitiva, a Comissão considera que a petição foi apresentada dentro de prazo
razoável, de acordo com a análise das informações apresentadas pelos
peticionários, e que se aplica a exceção com respeito ao prazo de seis meses
prevista no artigo 46(2)(c) e no artigo 37(2)(c) do Regulamento da Comissão. A
Comissão deixa consignado que essa consideração também se aplica ao que se refere
à sua competência com respeito à Convenção de Belém do Pará, segundo o disposto
em seu artigo 12 in fine.
c) Duplicação de procedimentos
34. Em relação à duplicação de procedimentos, não consta que os fatos de que se
trata tenham sido denunciados perante outra instância, não havendo o Estado se
manifestado a esse respeito; por conseguinte, a Comissão considera que a
petição é admissível, em conformidade com os artigos 46,c e 47,d da Convenção
Americana.
d) Conclusões sobre competência e admissibilidade
35. Ante o exposto, a Comissão considera que é competente para decidir deste
caso e que a petição cumpre os requisitos de admissibilidade previstos na
Convenção Americana sobre Direitos Humanos e na Convenção de Belém do Pará.
V. ANÁLISE DOS MÉRITOS DO CASO
36. O silêncio processual do Estado com respeito à petição contradiz a
obrigação que assumiu ao ratificar a Convenção Americana em relação à faculdade
da Comissão para “atuar com respeito às petições e outras comunicações, no
exercício de sua autoridade, em conformidade com o disposto nos artigos 44 e 51
da Convenção”. A Comissão analisou o caso com base nos documentos apresentados
pelos peticionários e outros elementos obtidos, levando em conta o artigo 42 de
seu Regulamento. Entre os documentos analisados encontram-se os seguintes:
- O livro publicado pela vítima “Sobrevivi, posso contar”.
- O relatório da Delegacia de Roubos e Furtos sobre sua investigação.
- Os relatórios médicos sobre o tratamento que a vítima Maria da Penha teve de
cumprir.
- Noticias de jornal sobre o caso e sobre a violência doméstica contra a mulher
em geral no Brasil.
- A denúncia contra Heredia Viveiros feita pelo Ministério Público.
- O relatório do Instituto de Polícia Técnica, de 8 de outubro de 1983, e da
Delegacia de Roubos e Furtos, dessa mesma data, ambos sobre a cena do crime e a
arma encontrada.
- As declarações das empregadas domésticas, de 5 de janeiro de 1984.
- O pedido de antecedentes de Marco Antonio Heredia Viveiros, de 9 de fevereiro
de 1984.
- O relatório do exame de saúde da vítima, de 10 de fevereiro de 1984.
- A sentença de pronúncia, de 31 de outubro de 1986, em que a Juíza de Direito
da 1a. Vara declara procedente a denuncia.
- A condenação pelo Júri, de 4 de maio de 1991.
- A alegação do Procurador-Geral solicitando seja o recurso rejeitado, de 12 de
dezembro de 1991.
- A anulação pelo Tribunal de Justiça do Estado, de 4 de maio de 1994, da
condenação do Júri original.
- A decisão do Tribunal de Justiça do Estado, de 3 de abril de 1995, aceitando
conhecer do recurso contra a sentença de pronúncia, mas negando-se a deliberar
a seu respeito, e submetendo o acusado a novo julgamento por Tribunal Popular.
- A decisão do Júri do novo Tribunal Popular condenando o acusado, de 15 de
março de 1996.
Na opinião da Comissão, da análise de todos os elementos de convicção
disponíveis não surgem elementos que permitam chegar a conclusões diferentes
com respeito aos assuntos analisados, as quais são a seguir apresentadas.[9] A
Comissão analisará primeiramente o direito à justiça segundo a Declaração e a
Convenção Americana, para então completar a análise aplicando a Convenção de
Belém do Pará.
A. Direito à justiça (artígo XVIII da Declaração); e às garantias judiciais
(artículo 8 da Convenção) e à proteção judicial (artigo 25 da Convenção), em
relação à obrigação de respeitar os direitos (artículo 1.1 da Convenção
37. Os artigos XVIII da Declaração e 8 e 25 da Convenção Americana sobre
Direitos Humanos estabelecem para cada pessoa o direito de acesso a recursos
judiciais e a ser ouvida por uma autoridade ou tribunal competente quando
considere que seus direitos foram violados, e reafirmam o artigo XVIII (Direito
à justiça) da Declaração, todos eles vinculados à obrigação prevista no artigo
1.1 da Convenção. Diz a Convenção o seguinte:
Artigo 25(1):
Toda pessoa tem direito a um recurso simples e rápido ou a qualquer outro
recurso efetivo, perante os juízes ou tribunais competentes, que a proteja
contra atos que violem seus direitos fundamentais reconhecidos pela
constituição, pela lei ou pela presente Convenção, mesmo quando tal violação
seja cometida por pessoas que estejam atuando no exercício de suas funções
oficiais
38. Transcorreram mais de 17 anos desde que foi iniciada a investigação pelas
agressões de que foi vítima a Senhora Maria da Penha Maia Fernandes e, até esta
data, segundo a informação recebida, continua aberto o processo contra o
acusado, não se chegou à sentença definitiva, nem foram reparadas as
conseqüências do delito de tentativa de homicídio perpetrado em prejuízo da
Senhora Fernandes[10]. A Corte Interamericana de Direitos Humanos disse que o
prazo razoável estabelecido no artigo 8(1) da Convenção não é um conceito de
simples definição e referiu-se a decisões da Corte Européia de Direitos Humanos
para precisá-lo. Essas decisões estabelecem que devem ser avaliados os
seguintes elementos para determinar a razoabilidade do prazo em que se
desenvolve o processo: a complexidade do assunto, a atividade processual do
interessado e a conduta das autoridades judiciais.[11]
39. Nesse sentido, na determinação de em que consiste a expressão “num prazo
razoável” deve-se levar em conta as particularidades de cada caso. In casu, a
Comissão levou em consideração tanto as alegações dos peticionários como o
silêncio do Estado.[12] A Comissão conclui que desde a investigação policial em
1984, havia no processo elementos probatórios claros e determinantes para
concluir o julgamento e que a atividade processual foi às vezes retardada por
longos adiamentos das decisões, pela aceitação de recursos extemporâneos e por
demoras injustificadas. Também considera que a vítima e peticionária neste caso
cumpriu as exigências quanto à atividade processual perante os tribunais
brasileiros, que vem sendo impulsionada pelo Ministério Público e pelos
tribunais atuantes, com os quais a vítima acusadora sempre colaborou. Por esse
motivo, a Comissão considera que nem as características do fato e da condição
pessoal dos implicados no processo, nem o grau de complexidade da causa, nem a
atividade processual da interessada constituem elementos que sirvam de escusa
para o retardamento injustificado da administração de justiça neste caso.
40. Desde o momento em que a Senhora Fernandes foi vítima do delito de
tentativa de homicídio em 1983, presumidamente por seu então esposo, e foram
iniciadas as respectivas investigações, transcorreram quase oito anos para que
fosse efetuado o primeiro juízo contra o acusado em 1991; os defensores
apresentaram um recurso de apelação extemporâneo, que foi aceito, apesar da
irregularidade processual e, após mais três anos o Tribunal decidiu anular o
juízo e a sentença condenatória existente.[13]
41. O novo processo foi postergado por um recurso especial contra a sentença de
pronúncia (indictment) de 1985 (recurso igualmente alegado como extemporâneo),
que só foi resolvido tardiamente em 3 de abril de 1995. O Tribunal de Justiça
do Estado do Ceará reafirmou dez anos depois a decisão tomada pelo Juiz em 1985
de que havia indícios de autoria por parte do acusado. Outro ano mais tarde, em
15 de março de 1996, um novo Júri condenou o Senhor Viveiros a dez anos e seis
meses de prisão, ou seja, cinco anos depois de ser pela primeira vez proferida
uma sentença neste caso. E, finalmente, embora ainda não encerrado o processo,
uma apelação contra a decisão condenatória está à espera de decisão desde 22 de
abril de 1997. Nesse sentido, a Comissão Interamericana observa que a demora
judicial e a prolongada espera para decidir recursos de apelação demonstra uma
conduta das autoridades judiciais que constitui uma violação do direito a obter
o recurso rápido e efetivo estabelecido na Declaração e na Convenção. Durante
todo o processo de 17 anos, o acusado de duas tentativas de homicídio contra
sua esposa, continuou – e continua – em liberdade.
42. Conforme manifestou a Corte Interamericana de Direitos Humanos:
É decisivo dilucidar se a ocorrência de determinada violação dos direitos
humanos reconhecidos pela Convenção contou com o apoio ou a tolerância do poder
público ou se este agiu de maneira que a transgressão tenha sido cometida por
falta de qualquer prevenção ou impunemente. Em definitivo, trata-se de
determinar se a violação dos direitos humanos resulta da inobservância, por
parte do Estado, de seus deveres de respeitar e garantir esses direitos, que
lhe impõe o artigo 1(1) da Convenção.[14]
Analogamente, a Corte estabeleceu o seguinte:
O Estado está, por outro lado, obrigado a investigar toda situação em que
tenham sido violados os direitos humanos protegidos pela Convenção. Se o
aparato do Estado age de maneira que tal violação fique impune e não seja
restabelecida, na medida do possível, a vítima na plenitude de seus direitos,
pode-se afirmar que não cumpriu o dever de garantir às pessoas sujeitas à sua
jurisdição o exercício livre e pleno de seus direitos. Isso também é válido
quando se tolere que particulares ou grupos de particulares atuem livre ou
impunemente em detrimento dos direitos reconhecidos na Convenção.[15]
43. Quanto às obrigações do Estado relativamente à circunstância de que se
tenha abstido de agir para assegurar à vítima o exercício de seus direitos, a
Corte Interamericana se manifestou da seguinte maneira:
A segunda obrigação dos Estados Partes é “garantir” o livre e pleno exercício
dos direitos reconhecidos na Convenção a toda pessoa sujeita à sua jurisdição.
Essa obrigação implica o dever dos Estados Partes de organizar todo o aparato
governamental e, em geral, todas as estruturas mediante as quais se manifesta o
exercício do poder público, de maneira que sejam capazes de assegurar
juridicamente o livre e pleno exercício dos direitos humanos. Em conseqüência
dessa obrigação, os Estados devem prevenir, investigar e punir toda violação
dos direitos reconhecidos pela Convenção e, ademais, procurar o
restabelecimento, na medida do possível, do direito conculcado e, quando for o
caso, a reparação dos danos produzidos pela violação dos direitos humanos.[16]
44. No caso em apreço, os tribunais brasileiros não chegaram a proferir uma
sentença definitiva depois de 17 anos, e esse atraso vem se aproximando da
possível impunidade definitiva por prescrição, com a conseqüente
impossibilidade de ressarcimento que, de qualquer maneira, seria tardia. A
Comissão considera que as decisões judiciais internas neste caso apresentam uma
ineficácia, negligência ou omissão por parte das autoridades judiciais
brasileira e uma demora injustificada no julgamento de um acusado, bem como
põem em risco definitivo a possibilidade de punir o acusado e indenizar a
vítima, pela possível prescrição do delito. Demonstram que o Estado não foi
capaz de organizar sua estrutura para garantir esses direitos. Tudo isso é uma
violação independente dos artigos 8 e 25 da Convenção Americana sobre Direitos
Humanos em relação com o artigo 1(1) da mesma, e dos artigos correspondentes da
Declaração.
B. Igualdade perante a lei (artigo 24 da Convenção) e artigos II e XVIII da
Declaração
45. Os peticionários também alegam a violação do artigo 24 da Convenção
Americana em relação ao direito de igualdade perante a Lei e ao direito à
justiça protegidos pela Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem
(artigos II e XVIII).
46. Nesse sentido, a Comissão Interamericana destaca que acompanhou com
especial interesse a vigência e evolução do respeito aos direitos da mulher,
especialmente os relacionados com a violência doméstica. A Comissão recebeu
informação sobre o alto número de ataques domésticos contra mulheres no Brasil.
Somente no Ceará (onde ocorreram os fatos deste caso) houve, em 1993, 1.183
ameaças de morte registradas nas Delegacias Policiais para a mulher, de um
total de 4.755 denúncias.[17]
47. As agressões domésticas contra mulheres são desproporcionadamente maiores
do que as que ocorrem contra homens. Um estudo do Movimento Nacional de
Direitos Humanos do Brasil compara a incidência de agressão doméstica contra
mulheres e contra homens e mostra que, nos assassinatos, havia 30 vezes mais
probabilidade de as vítimas o sexo feminino terem sido assassinadas por seu
cônjuge, que as vítimas do sexo masculino. A Comissão constatou, em seu
Relatório Especial sobre o Brasil, de 1997, que havia uma clara discriminação
contra as mulheres agredidas, pela ineficácia dos sistemas judiciais
brasileiros e sua inadequada aplicação dos preceitos nacionais e
internacionais, inclusive dos procedentes da jurisprudência da Corte Suprema do
Brasil. Dizia e Comissão em seu relatório sobre a situação dos direitos humanos
em 1997:
Além disso, inclusive onde existem essas delegacias especializadas, o caso com
freqüência continua a ser que as mulheres não são de todo investigadas ou
processadas. Em alguns casos, as limitações entorpecem os esforços envidados
para responder a esses delitos. Em outros casos, as mulheres não apresentam denúncias
formais contra o agressor. Na prática, as limitações legais e de outra natureza
amiúde expõem as mulheres a situações em que se sentem obrigadas a atuar. Por
lei, as mulheres devem apresentar suas queixas a uma delegacia e explicar o que
ocorreu para que o delegado possa redigir a “denúncia de incidente”. Os
delegados que não tenham recebido suficiente treinamento podem não ser capazes
de prestar os serviços solicitados, e alguns deles, segundo se informa,
continuam a responder às vítimas de maneira a fazer com que se sintam
envergonhadas e humilhadas. Para certos delitos, como a violação sexual, as
vítimas devem apresentar-se ao Instituto Médico Legal, que tem a competência
exclusiva para realizar os exames médicos requeridos pela lei para o processamento
da denúncia. Algumas mulheres não têm conhecimento desse requisito, ou não têm
acesso à referida instituição da maneira justa e necessária para obter as
provas exigidas. Esses institutos tendem a estar localizados em áreas urbanas
e, quando existem, com freqüência não dispõem de pessoal suficiente. Além
disso, inclusive quando as mulheres tomam as medidas necessárias para denunciar
a prática de delitos violentos, não há garantia de que estes serão investigados
e processados.
Apesar de o Tribunal Supremo do Brasil ter revogado em 1991 a arcaica “defesa
da honra” como justificação para o assassinato da esposa, muitos tribunais
continuam a ser relutantes em processar e punir os autores da violência
doméstica. Em algumas áreas do país, o uso da “defesa da honra” persiste e, em
algumas áreas, a conduta da vítima continua a ser um ponto central no processo
judicial de um delito sexual. Em vez de se centrarem na existência dos
elementos jurídicos do delito, as práticas de alguns advogados defensores –
toleradas por alguns tribunais – têm o efeito de requerer que a mulher
demonstre a santidade de sua reputação e sua inculpabilidade moral a fim de
poder utilizar os meios judiciais legais à sua disposição. As iniciativas
tomadas tanto pelo setor público como pelo setor privado para fazer frente à
violência contra a mulher começaram a combater o silêncio que tradicionalmente
a tem ocultado, mas ainda têm de superar as barreiras sociais, jurídicas e de
outra natureza que contribuem para a impunidade em que amiúde enlanguescem.
48. Nesse relatório também se faz referência a diferentes estudos que comprovam
que, nos casos registrados em estatísticas, estas mostram que somente parte dos
delitos denunciados nas delegacias de polícia especializadas são atualmente
investigados. (União de Mulheres de São Paulo, A violência contra a mulher e a
impunidade: Uma questão política (1995). Em 1994, de 86.815 queixas
apresentadas por mulheres agredidas domesticamente, somente foram iniciadas
24.103 investigações policiais, segundo o referido relatório.
49. Outros relatórios indicam que 70% das denúncias criminais referentes a
violência doméstica contra mulheres são suspensas sem que cheguem a uma
conclusão. Somente 2% das denúncias criminais de violência doméstica contra
mulheres chegam à condenação do agressor. (Relatório da Universidade Católica
de São Paulo, 1998).
50. Nessa análise do padrão de resposta do Estado a esse tipo de violação, a
Comissão também nota medidas positivas efetivamente tomadas nos campos
legislativo, judiciário e administrativo[18]. A Comissão salienta três
iniciativas diretamente relacionadas com os tipos de situação exemplificados
por este caso: 1) a criação de delegacias policiais especiais para o
atendimento de denúncias de ataques a mulheres: 2) a criação de casas de
refúgio para mulheres agredidas; e 3) a decisão da Corte Suprema de Justiça em
1991 que invalidou o conceito arcaico de “defesa da honra” como causal de
justificação de crimes contra as esposas. Essas iniciativas positivas, e outras
similares, foram implementadas de maneira reduzida em relação à importância e
urgência do problema, conforme se observou anteriormente. No caso emblemático
em estudo, não tiveram efeito algum.
C. Artigo 7 da Convenção de Belém do Pará
51. Em 27 de novembro de 1995, o Brasil depositou seu instrumento de
ratificação da Convenção de Belém do Pará, o instrumento interamericano
mediante o qual os Estados americanos reconhecem a importância do problema,
estabelecem normas a serem cumpridas e compromissos a serem assumidos para
enfrentá-lo e instituem a possibilidade para qualquer pessoa ou organização de
apresentar petições ou instaurar ações sobre o assunto perante a Comissão
Interamericana de Direitos Humanos pelos procedimentos desta. Os peticionários
solicitam que seja declarada a violação, por parte do Estado, dos artigos 3, 4,
5 e 7 da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência
contra a Mulher e alegam que este caso deve ser analisado à luz da
discriminação de gênero por parte dos órgãos do Estado brasileiro, que reforça
o padrão sistemático de violência contra a mulher e a impunidade no Brasil.
52. Como se observou anteriormente, a Comissão tem competência ratione materiae
e ratione temporis para conhecer deste caso segundo o disposto na Convenção de
Belém do Pará com respeito a fatos posteriores à sua ratificação pelo Brasil,
ou seja, a alegada violação continuada do direito à tutela judicial efetiva e,
por conseguinte, pela intolerância que implicaria com respeito à violência contra
a mulher.
53. A Convenção de Belém do Pará é um instrumento essencial que reflete os
ingentes esforços envidados no sentido de encontrar medidas concretas de
proteção do direito da mulher a uma vida livre de agressões e violência, tanto
dentro como fora de seu lar e núcleo familiar. A CVM define assim a violência
contra a mulher:
Artigo 2
Entende-se que a violência contra a mulher abrange a violência física, sexual e
psicológica:
a) ocorrida no âmbito da família ou unidade doméstica ou em qualquer relação
interpessoal, quer o agressor compartilhe, tenha compartilhado ou não a sua
residência, incluindo-se, entre outras formas, o estupro, maus-tratos e abuso
sexual;
b) ocorrida na comunidade e cometida por qualquer pessoa, incluindo, entre
outras formas, o estupro, abuso sexual, tortura, tráfico de mulheres,
prostituição forçada, seqüestro e assédio sexual no local de trabalho, bem como
em instituições educacionais, serviços de saúde ou qualquer outro local; e
c) perpetrada ou tolerada pelo Estado ou seus agentes, onde quer que ocorra.
54. O âmbito de aplicação da CVM refere-se pois a situações definidas por duas
condições: primeiro, que tenha havido violência contra a mulher conforme se
descreve nas alíneas a e b; e segundo, que essa violência seja perpetrada ou
tolerada pelo Estado. A CVM protege, entre outros, os seguintes direitos da
mulher violados pela existência dessa violência: o direito a uma vida livre de
violência (artigo 3), a que seja respeitada sua vida, sua integridade física,
psíquica e moral e sua segurança pessoal, sua dignidade pessoal e igual
proteção perante a lei e da lei; e a recurso simples e rápido perante os
tribunais competentes, que a ampare contra atos que violem seus direitos
(artigo 4,a,b,c,d,e,f,g e os conseqüentes deveres do Estado estabelecidos no
artigo 7 desse instrumento. O artigo 7 da Convenção Interamericana para
Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher diz o seguinte:
DEVERES DOS ESTADOS
Artigo 7
Os Estados Partes condenam todas as formas de violência contra a mulher e
convêm em adotar, por todos os meios apropriados e sem demora, políticas
destinadas a prevenir, punir e erradicar tal violência e a empenhar-se em:
a) abster-se de qualquer ato ou prática de violência contra a mulher e velar por
que as autoridades, seus funcionários e pessoal, bem como agentes e
instituições públicos ajam de conformidade com essa obrigação;
b) agir com o devido zelo para prevenir, investigar e punir a violência contra
a mulher;
c) incorporar na sua legislação interna normas penais, civis, administrativas e
de outra natureza, que sejam necessárias para prevenir, punir e erradicar a
violência contra a mulher, bem como adotar as medidas administrativas adequadas
que forem aplicáveis;
d) adotar medidas jurídicas que exijam do agressor que se abstenha de
perseguir, intimidar e ameaçar a mulher ou de fazer uso de qualquer método que
danifique ou ponha em perigo sua vida ou integridade ou danifique sua
propriedade;
e) tomar todas as medidas adequadas, inclusive legislativas, para modificar ou
abolir leis e regulamentos vigentes ou modificar práticas jurídicas ou
consuetudinárias que respaldem a persistência e a tolerância da violência
contra a mulher;
f) estabelecer procedimentos jurídicos justos e eficazes para a mulher
sujeitada a violência, inclusive, entre outros, medidas de proteção, juízo
oportuno e efetivo acesso a tais processos;
g) estabelecer mecanismos judiciais e administrativos necessários para
assegurar que a mulher sujeitada a violência tenha efetivo acesso a
restituição, reparação do dano e outros meios de compensação justos e eficazes;
h) adotar as medidas legislativas ou de outra natureza necessárias à vigência
desta Convenção.
55. A impunidade que gozou e ainda goza o agressor e ex-esposo da Senhora
Fernandes é contrária à obrigação internacional voluntariamente assumida por
parte do Estado de ratificar a Convenção de Belém do Pará. A falta de
julgamento e condenação do responsável nessas circunstâncias constitui um ato
de tolerância, por parte do Estado, da violência que Maria da Penha sofreu, e
essa omissão dos tribunais de justiça brasileiros agrava as conseqüências
diretas das agressões sofridas pela Senhora Maria da Penha Maia Fernandes. Além
disso, como foi demonstrado anteriormente, essa tolerância por parte dos órgãos
do Estado não é exclusiva deste caso, mas uma pauta sistemática. Trata-se de
uma tolerância de todo o sistema, que não faz senão perpetuar as raízes e
fatores psicológicos, sociais e históricos que mantêm e alimentam a violência
contra a mulher.
56. Dado que essa violação contra Maria da Penha é parte de um padrão geral de
negligência e falta de efetividade do Estado para processar e condenar os
agressores, a Comissão considera que não só é violada a obrigação de processar
e condenar, como também a de prevenir essas práticas degradantes. Essa falta de
efetividade judicial geral e discriminatória cria o ambiente propício à
violência doméstica, não havendo evidência socialmente percebida da vontade e
efetividade do Estado como representante da sociedade, para punir esses atos.
57. Em relação às alíneas c e h do artigo 7, a Comissão deve considerar as
medidas tomadas pelo Estado para eliminar a tolerância da violência doméstica.
A Comissão chamou a atenção positivamente para várias medidas tomadas pela
atual administração com esse objetivo, particularmente para a criação de
delegacias especiais de polícia e de refúgios para mulheres agredidas, entre
outras.[19] Entretanto, neste caso emblemático de tantos outros, a ineficácia judicial,
a impunidade e a impossibilidade de a vítima obter uma reparação mostra a falta
de cumprimento do compromisso de reagir adequadamente ante a violência
doméstica. O artigo 7 da Convenção de Belém do Pará parece ser uma lista dos
compromissos que o Estado brasileiro ainda não cumpriu quanto a esses tipos de
caso.
58. Ante o exposto, a Comissão considera que se verificam neste caso as
condições de violência doméstica e de tolerância por parte do Estado definidas
na Convenção de Belém do Pará e que o Estado é responsável pelo não-cumprimento
de seus deveres estabelecidos nas alíneas b, d, e, f e g do artigo 7 dessa
Convenção, em relação aos direitos por ela protegidos, entre os quais o direito
a uma vida livre de violência (artigo 3), a que seja respeitada sua vida, sua
integridade física, psíquica e moral e sua segurança pessoal, sua dignidade
pessoal, igual proteção perante a lei e da lei; e a recurso simples e rápido
perante os tribunais competentes, que a ampare contra atos que violem seus
direitos (artigo 4,a,b,c,d,e,f,g).
VI. AÇÕES POSTERIORES AO RELATÓRIO 105/00
59. A Comissão aprovou o Informe 105/00 no dia 19 de outubro de 2000 durante o
108º período de sessões. O referido Relatório foi transmitido ao Estado
Brasileiro em 1º de novembro de 2000, concedendo-lhe o prazo de dois meses para
dar cumprimento às recomendações formuladas e informou os peticionários sobre a
aprovação de um relatório nos termos do artigo 50 da Convenção. O prazo
concedido transcorreu sem que a Comissão recebesse a resposta do Estado sobre
essas recomendações, motivo pelo qual a Comissão considera que as mencionadas
recomendações não foram cumpridas.
VII. CONCLUSÕES
60. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos reitera ao Estado Brasileiro
as seguintes conclusões:
1. Que tem competência para conhecer deste caso e que a petição é admissível em
conformidade com os artigos 46.2,c e 47 da Convenção Americana e com o artigo
12 da Convenção de Belém do Pará, com respeito a violações dos direitos e
deveres estabelecidos nos artigos 1(1) (Obrigação de respeitar os direitos, 8
(Garantias judiciais), 24 (Igualdade perante a lei) e 25 (Proteção judicial) da
Convenção Americana em relação aos artigos II e XVIII da Declaração Americana,
bem como no artigo 7 da Convenção de Belém do Pará.
2. Que, com fundamento nos fatos não controvertidos e na análise acima exposta,
a República Federativa do Brasil é responsável da violação dos direitos às
garantias judiciais e à proteção judicial, assegurados pelos artigos 8 e 25 da
Convenção Americana em concordância com a obrigação geral de respeitar e
garantir os direitos, prevista no artigo 1(1) do referido instrumento pela
dilação injustificada e tramitação negligente deste caso de violência doméstica
no Brasil.
3. Que o Estado tomou algumas medidas destinadas a reduzir o alcance da
violência doméstica e a tolerância estatal da mesma, embora essas medidas ainda
não tenham conseguido reduzir consideravelmente o padrão de tolerância estatal,
particularmente em virtude da falta de efetividade da ação policial e judicial
no Brasil, com respeito à violência contra a mulher.
4. Que o Estado violou os direitos e o cumprimento de seus deveres segundo o
artigo 7 da Convenção de Belém do Pará em prejuízo da Senhora Fernandes, bem
como em conexão com os artigos 8 e 25 da Convenção Americana e sua relação com
o artigo 1(1) da Convenção, por seus próprios atos omissivos e tolerantes da
violação infligida.
VIII. RECOMENDAÇÕES
61. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos reitera ao Estado Brasileiro
as seguintes recomendações:
1. Completar rápida e efetivamente o processamento penal do responsável da
agressão e tentativa de homicídio em prejuízo da Senhora Maria da Penha
Fernandes Maia.
2. Proceder a uma investigação séria, imparcial e exaustiva a fim de determinar
a responsabilidade pelas irregularidades e atrasos injustificados que impediram
o processamento rápido e efetivo do responsável, bem como tomar as medidas
administrativas, legislativas e judiciárias correspondentes.
3. Adotar, sem prejuízo das ações que possam ser instauradas contra o
responsável civil da agressão, as medidas necessárias para que o Estado
assegure à vítima adequada reparação simbólica e material pelas violações aqui
estabelecidas, particularmente por sua falha em oferecer um recurso rápido e
efetivo; por manter o caso na impunidade por mais de quinze anos; e por impedir
com esse atraso a possibilidade oportuna de ação de reparação e indenização
civil.
4. Prosseguir e intensificar o processo de reforma que evite a tolerância
estatal e o tratamento discriminatório com respeito à violência doméstica
contra mulheres no Brasil. A Comissão recomenda particularmente o seguinte:
a) Medidas de capacitação e sensibilização dos funcionários judiciais e
policiais especializados para que compreendam a importância de não tolerar a
violência doméstica;
b) Simplificar os procedimentos judiciais penais a fim de que possa ser
reduzido o tempo processual, sem afetar os direitos e garantias de devido
processo;
c) O estabelecimento de formas alternativas às judiciais, rápidas e efetivas de
solução de conflitos intrafamiliares, bem como de sensibilização com respeito à
sua gravidade e às conseqüências penais que gera;
d) Multiplicar o número de delegacias policiais especiais para a defesa dos
direitos da mulher e dotá-las dos recursos especiais necessários à efetiva
tramitação e investigação de todas as denúncias de violência doméstica, bem
como prestar apoio ao Ministério Público na preparação de seus informes
judiciais.
e) Incluir em seus planos pedagógicos unidades curriculares destinadas à
compreensão da importância do respeito à mulher e a seus direitos reconhecidos
na Convenção de Belém do Pará, bem como ao manejo dos conflitos
intrafamiliares.
5. Apresentar à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, dentro do prazo de
60 dias a partir da transmissão deste relatório ao Estado, um relatório sobre o
cumprimento destas recomendações para os efeitos previstos no artigo 51(1) da
Convenção Americana.
IX. PUBLICAÇÃO
62. Em 13 de março de 2001, a Comissão decidiu enviar este relatório ao Estado
brasileiro, de acordo com o artigo 51 da Convenção, e lhe foi concedido o prazo
de um mês, a partir do envio, para o cumprimento das recomendações acima
indicadas. Expirado esse prazo, a Comissão não recebeu resposta do Estado
brasileiro.
63. Em virtude das considerações anteriores e, de conformidade com os artigos
51(3) da Convenção Americana e 48 de seu Regulamento, a Comissão decidiu
reiterar as conclusões e recomendações dos parágrafos 1 e 2, tornar público
este relatório e incluí-lo em seu Relatório Anual à Assembléia Geral da OEA. A
Comissão, em cumprimento de seu mandato, continuará a avaliar as medidas
tomadas pelo Estado brasileiro com relação às recomendações mencionadas, até
que tenham sido cabalmente cumpridas. (Assinado): Presidente; Claudio Grossman,
Primer Vicepresidente; Juan Méndez, Segungo- Vicepresidente; Marta
Altolaguirre, Comissionados: Robert K. Goldman, Julio Prado Vallejo e Peter
Laurie.
--------------------------------------------------------------------------------
* O membro da Comissão Hélio Bicudo, de nacionalidade brasileira, não
participou do debate nem da votação deste caso em cumprimento ao artigo
19(2)(a) do Regulamento da Comissão.
[1] Segundo a denúncia e os anexos apresentados pelos peticionários, o Senhor
Viveiros disparou uma arma de fogo contra sua esposa enquanto ela dormia. Ante
o temor, e para evitar um segundo disparo, a Senhora Fernandes ficou estirada
na cama simulando estar morta; entretanto, ao chegar ao hospital se encontrava
em estado de choque e tetraplégica em conseqüência de lesões destrutivas na
terceira e quarta vértebras, entre outras lesões que se manifestaram
posteriormente. Documento dos peticionários, de 13 de agosto de 1996, recebido
na Secretaria da CIDH em 20 de agosto do mesmo ano, página 2; e FERNANDES
(Maria da Penha Maia), Sobrevivi, posso contar, Fortaleza, 1994, páginas 29-30)
(Anexo 1 da denúncia).
[2] Segundo declarações da vítima, no segundo fim de semana após seu regresso
de Brasília, o Senhor Viveiros lhe perguntou se desejava tomar banho e, quando
ela se achava em baixo do chuveiro, sentiu um choque elétrico com a corrente de
água. A Senhora Fernandes se desesperou e procurou sair do chuveiro, enquanto
seu esposo lhe dizia que um pequeno choque elétrico não podia matá-la.
Manifesta que nesse momento entendeu por que, desde seu regresso, o Senhor
Viveiros somente utilizava o banheiro de suas filhas para banhar-se. Documento
dos peticionários, de 13 de agosto de 1998, página 5 e anexo 2 do mesmo
documento.
[3] Declara a denúncia que várias provas recolhidas demonstravam que o
ex-marido de Maria da Penha tinha a intenção de matá-la e fazer crer num
assalto à sua residência. Acrescentam cópia do laudo da Polícia Técnica e das
declarações testemunhais das empregadas domésticas, que descrevem com riqueza
de detalhes indícios da culpabilidade do Senhor Heredia Viveiros. Entre os
elementos que descrevem está a negativa do acusado quanto a que tivesse uma
espingarda, arma de fogo que logo se comprovou possuir, e com respeito a seus
constantes ataques físicos à esposa, bem como estão graves contradições em sua
narrativa do que sucedeu.
[4] O próprio Júri se manifestou sobre o alto grau de culpabilidade do réu, bem
como sobre sua personalidade perigosa, que se revelaram na perpetração do crime
e em suas graves conseqüências, ao proferir a condenação de 15 anos de prisão
no primeiro julgamento. FERNANDES (Maria da Penha Maia), Sobreviv, ,posso
contar, Fortaleza, 1994, página 74.
[5] CIDH, Relatório sobre a situação dos direitos humanos no Brasil, 1997.
Capítulo VIII.
[6] Os peticionários indicam que essa situação foi inclusive reconhecida pelas
Nações Unidas e apresentam notas de jornal como anexos à sua denúncia. Observam
que 70% dos incidentes de violência contra mulheres ocorrem em seus lares
(Human Rights Watch. Report on Brazil, 1991, página 351); e que uma delegada de
polícia do Rio de Janeiro declarou que dos mais de 2000 casos de estupro e
ferimento com golpe registrados em sua Delegacia, não conhecia nenhum que
tivesse chagado a punir o acusado (Relatório HRW, página 367).
[7] Neste sentido, a Comissão tem jurisprudência firme, ver CIDH, Caso 11.516,
Ovelario Tames, Relatório Anual 1998, (Brasil) par.26 e 27 , Caso 11.405 Newton
Coutinho Mendes y otros, Relatório 1998 (Brasil), Caso 11.598 Alonso Eugenio da
Silva, Relatório Anual 1998 (Brasil), par. 19 e 20, Caso 11.287 Joao Canuto de
Oliveira, Relatório Anual 1997 (Brasil).
A Corte Interamericana de Direitos Humanos se pronunciou em diversas ocasiões
sobre o conceito de violação contínua, especialmente aplicado ao tema dos
desaparecimentos forçados:
O desaparecimento forçado implica a violação de vários direitos reconhecidos
nos tratados interamericanos de direitos humanos, entre elas a Convenção
Americana, e os efeitos dessas infrações, inclusive algumas, como neste caso,
que tenham sido consumadas, podem prolongar-se de maneira contínua ou
permanente até o momento em que se estabeleça o destino da vítima.
Em virtude do exposto, como o destino ou paradeiro do Senhor Blake não era
conhecido pelos familiares da vítima até o dia 14 de junho de 1992, ou seja,
posteriormente à data em que a Guatemala se submeteu à jurisdição contenciosa
deste Tribunal, a exceção preliminar que o Governo fez fazer deve ser
considerada infundada quanto aos efeitos e condutas posteriores à referida
sujeição. Por esse motivo, a Corte tem competência para conhecer das possíveis
violações que a Comissão imputa ao próprio Governo quanto a tais efeitos e condutas.
Corte IDH, Caso Blake, Sentença de Exceções Preliminares, de 2 de julho de
1996, parágrafos 39 y 40. Nesse mesmo sentido, ver: Corte IDH, Caso Velásquez
Rodríguez, Sentença de 29 de julho de 1988, parágrafo 155; e Caso Godínez Cruz,
Sentença de 20 de janeiro de 1989, parágrafo 163. Também aceitou, no caso Genie
Lacayo (parágrafos 21 e 24 Exce.. Pulio) conhecer da violação dos artigos 2, 8,
24 e 25, que formavam parte de uma denegação de justiça que começava antes da
aceitação não-retroativa da competência da Corte, mas continuava depois dela.
Ademais, a noção de situação continuada conta igualmente com reconhecimento
judicial por parte da Corte Européia de Direitos Humanos, em decisões sobre
casos relativos a detenção que remontam à década de 60., e por parte da
Comissão de Direitos Humanos , cuja prática de acordo com o Pacto de Direito
Civis e Políticos das Nações Unidas e seu primeiro Protocolo Facultativo, a
partir do início da década de 80, contém exemplos do exame de situações
continuadas que geravam fatos que ocorriam ou persistiam depois da data de
entrada em vigor do Pacto e do Protocolo com respeito ao Estado em apreço, e
que constituíam per se violações de direitos consagrados no Pacto.
[8] Corte IDH. Caso Godinez Cruz. Exceções preliminares. Sentença de 26 de
junho de 1987. Série C No.3, cujos parágrafos 90 e 91 dizem o seguinte: “Dos
princípios de direito internacional em geral reconhecidos resulta, em primeiro
lugar, que se trata de uma norma a cuja invocação o Estado que tem direito a
invocá-la pode renunciar expressa ou tacitamente, o que já foi reconhecido pela
Corte em oportunidade anterior (ver Asunto de Viviana Gallardo y otras, decisão
de 13 de novembro de 1981, No. G 101/81. Série A, parágrafo 26). Em segundo
lugar, que a exceção de não-esgotamento dos recursos da jurisdição interna,
para que seja oportuna, deve ser suscitada nas primeiras etapas do
procedimento, podendo-se na falta disso presumir a renúncia tácita do Estado
interessado a valer-se da mesma. Em terceiro lugar, que o Estado que alega o
não-esgotamento tem a seu cargo a indicação dos recursos internos que devem ser
esgotados e de sua efetividade”.
Ao aplicar esses princípios a este caso, a Corte observa que o expediente
evidencia que o Governo não interpôs a exceção oportunamente, ao tomar a
Comissão conhecimento da denúncia a ela apresentada, e que nem sequer a fez
valer tardiamente durante todo o tempo em que o assunto foi substanciado pela
Comissão.
[9] Como parte desta análise, a Comissão fundamentou seu estudo principalmente
nos documentos apresentados pelos peticionários, além de em outros documentos
disponíveis tais como: CIDH, Relatório da Comissão Interamericana de Direitos
Humanos sobre a condição da mulher nas Américas, de 13 de outubro de 1998,
página 91; CIDH, Relatório sobre a situação dos Direitos Humanos no Brasil, de
29 de setembro de 1997, página 164; Nações Unidas, Development Programme, Human
Development Report 2000. Oxford University Press, página 290; bem como em
diversa jurisprudência do Sistema Inteamericano e internacional.
[10] Quase a metade desse tempo, desde 25 de setembro de 1992, sob a vigência
para o Brasil da Convenção Americana e, igualmente, desde 27 de novembro de
1995, da Convenção de Belém do Pará.
[11] CORTE IDH, Caso Genie Lacayo, Sentença de 29 de janeiro de 1997, parágrafo
77.
[12] Nesse sentido, a Comissão considera importante lembrar que a Corte
Interamericana manifestou que:
Cabe ao Estado controlar os meios para aclarar fatos ocorridos em seu
território. A Comissão, embora tenha faculdades para fazer investigações,
depende na prática, para poder efetuá-las dentro da jurisdição do Estado, da
cooperação e dos meios que o Governo lhe proporcione.
Corte IDH, Caso Velásquez Rodríguez, Sentença de 29 de julho de 1988, parágrafo
136.
[13] Os peticionários alegam que o fundamento deste recurso de apelação não
procedia, segundo o artigo 479 do Código Processual Penal do Brasil; a Comissão
considera esse aspecto de acordo com as faculdades que lhe confere o artigo
XVIII da Declaração Americana.
[14] Corte IDH, Caso Velásquez Rodríguez, Sentença de 29 de julho de 1988,
parágrafo 173.
[15] Corte IDH, Caso Velásquez Rodríguez, Sentença de 29 de julho de 1988,
parágrafo 176; e Corte IDH, Caso Godínez Cruz, Sentença de 20 de janeiro de
1989, parágrafo 187.
[16] Corte IDH, Caso Godínez Cruz, Sentença de 20 de janeiro de 1989, parágrafo
175.
[17] Maia Fernandez, Maria da Penha, “Sobrevivi, posso contar”. Fortaleza,
1994, página150; datos baseados em informação das Delegacias Policiais.
[18] Em conseqüência da ação concertada do setor governamental e do CNDM
(Conselho Nacional dos Direitos da Mulher), a Constituição brasileira de 1988
reflete importante avanço a favor dos direitos da mulher. No Programa Nacional
sobre Direitos Humanos, as iniciativas propostas pelo Governo, que pretendem
melhorar os direitos da mulher, incluem inter alia apoio ao Conselho Nacional
dos Direitos da Mulher e ao Programa Nacional para Prevenir a Violência contra
a Mulher; apoio para prevenir a violência sexual e doméstica contra a mulher,
prestar assistência integrada às mulheres em risco e educar o público sobre a
discriminação e a violência contra a mulher e as garantias disponíveis;
revogação de certas disposições discriminatórias do Código Penal e do Código
Civil sobre o pátrio poder; promoção do desenvolvimento de enfoques orientados
para a condição de homem ou mulher na capacitação dos agentes do Estado e no
estabelecimento de diretrizes para os planos de estudo da educação de nível
básico e médio; e promoção de estudos estatísticos sobre a situação da mulher
no âmbito trabalhista. O Programa também encarrega o Governo de implementar as
decisões consagradas na Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e
Erradicar a Violência contra a Mulher.
[19] Ver o capítulo relativo aos direitos da mulher brasileira no Relatório
Especial da CIDH sobre a Situação dos Direitos Humanos no Brasil, 1997.
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello determinou o
retorno à ativa do juiz Edilson Rumbelsperger Rodrigues, da comarca de Sete
Lagoas (MG). Em novembro do ano passado, ele foi suspenso por pelo menos dois
anos, acusado de usar linguagem discriminatória e preconceituosa em sentenças
nas quais considerou inconstitucional a Lei Maria da Penha. O magistrado também
rejeitou pedidos de medidas contra homens que agrediram e ameaçaram suas
companheiras.
A decisão do ministro do STF é liminar e pode ser contestada no plenário. Marco
Aurélio Mello considerou o afastamento “inadequado” e afirmou que as afirmações
do magistrado foram feitas de forma "abstrata", sem se referir a uma
pessoa em particular. Para ele, as sentenças do juiz são resultado de sua
“concepção individual”.
"É possível que não se concorde com premissas da decisão proferida, com
enfoques na seara das ideias, mas isso não se resolve afastando o magistrado
dos predicados próprios à atuação como ocorre com a disponibilidade",
afirmou Marco Aurélio.
Em 2007, Rodrigues atacou a lei em algumas sentenças, classificando-a como um
“conjunto de regras diabólicas”. Ainda segundo o juiz, a “desgraça humana”
teria começado por causa da mulher.
"A vingar esse conjunto de regras diabólicas, a família estará em perigo
(..) Ora, a desgraça humana começou no Éden: por causa da mulher. Todos nós
sabemos, mas também em virtude da ingenuidade, da tolice e da fragilidade
emocional do homem", segundo trechos de decisões do juiz.
Rodrigues responde a processo administrativo no CNJ desde setembro de 2009. Na
época, ele negou que tenha havido “excesso de linguagem” e se defendeu da
acusação de preconceito.
“Eu não ofendi a parte e nem a quem quer que seja. Eu me insurgi contra uma lei
em tese, e mesmo assim, parte dela. Combato um feminismo exagerado, que
negligencia a função paterna, que quer igualdade sim, mas fazendo questão de
serem mantidas intactas todas as benesses da feminilidade”, afirmou o juiz.
“Entre o excesso de linguagem e a postura que vise inibi-lo, há de ficar-se com
o primeiro, pois existem meios adequados à correção, inclusive, se necessário”,
afirmou o ministro do STF em sua decisão. As informações são do G1.
Conclusões:
A Senhora Maria da Penha
Um dia, estava ela deitada em seu leito quando foi subitamente acordada pelo
seu marido com um forte estampido.
Naquele dia o Senhor marido, Marcos Heredia, acordou, deu comida aos pássaros,
lavou o carro, ligou o rádio, manejou o videogame, e como estava entediado,
pegou a espingarda e teve a idéia de fazer uns pequenos orifícios nas costas de
Maria da Penha.
Por causa desta brincadeira de mau gosto, sem nenhuma motivação, porque ela era
uma boa senhora e excelente mãe e esposa, o Seu Marcos foi condenado pelo júri
popular e foi sentenciado a quinze anos de reclusão.
Insatisfeita pela demora do julgamento, a Senhora Maria da Penha recorreu ao
tribunal da OEA para denunciar a morosidade da justiça em seu caso, já que
demorou apenas 10 anos, o julgamento, uma coisa muito rara no Brasil, cuja
Justiça é conhecida pela sua celeridade.
Como o devido processo legal instaurado contra o acusado lhes permitiu ser
ouvido pelos membros do tribunal do júri a pena de quinze anos foi atenuada
para apenas dez anos, a contragosto de Maria da Penha.
Insatisfeita com o desfecho, as feministas e os defensores dos direitos humanos
das mulheres, vítimas da violência característica masculina, conseguiram a
promulgação de uma Lei que faz o divórcio de fato, em um ritual bastante
simples, sumário, unilateral, sem o contraditório, sem a legítma presunção da
inocência do acusado, sem o devido processo legal, permitindo que o acusado vá
imediatamente para a cadeia e nunca mais possa retornar ao seu lar, ficando
despossuído de todos os seus pertences e objetos pessoais, profissionais,
sentimentais, e de valor.
Está assim concretizada a vingança das mulheres contra os homens violentos, já
que a justiça é sempre insuficiente, mesmo vendo seu ex-marido condenado pelo
devido processo legal, Maria da Penha agora, heroína, vai ser elevada ao
símbolo máximo da defesa da justiça.
Agora, sem ironia.
Não se cura a síndrome do coração-partido de um homem com o seu confinamento
penal. Isto apenas aguça o seu espírito de vingança, e acende a sensação de
injustiça, quiçá, desperta um sentimento de desproporcionalidade do castigo
aplicado, já que as consequências da Lei Maria da Penha determinam um divórcio
de fato que viola as convenções e preconvenções nupciais, caça todos os
direitos formais do acusado, e age de modo extremamente viral, vingativo,
excludente, irreversível, sumário e precipitado.
Problemas emocionais devem cair no âmbito dos psicólogos e terapeutas de
família, não nas mãos de um delegado de polícia, de um oficial de justiça, ou
de policiais do GATE, BOPE, GARRA, do agente da polícia Civil ou Militar que
não foram treinados para compreenderem as doenças do coração atarantado de um
amor ferido. O resultado destes equívocos é que tem diminuído de forma
insignificante os crimes contra as mulheres, e o tempo irá revogar este grande
equívoco, juntamente com o malfadado Estatuto da Criança e do Adolescente, duas
jaboticabas tupiniquins inseridas no nosso emaranhado código de conduta legal
brasileirinho.
Já que carecem os argumentos de tipo formal-legal, lógico, constitucional,
então somente as estatísticas irão demonstrar o absurdo desta Lei de exceção, o
verdadeiro AI-5 do código de processo penal em época pós-ditadura no Brasil.
Uma excrescência jurídica, resultado da condenação do judiciário pela OEA, que
condenou o processo legal no Brasil, e não o senhor Heredia.
A pedagogia da punição
No Brasil está se implantando a corrente da AntiPedagogia: a Pedagogia da
punição.
É uma corrente nova-velha que preconiza a correção punitiva pavloviana. Em
lugar de ensinar, de apoiar as instituições que instruem e que fornecem um
treinamento social aos indivíduos, ela acredita que punir seja mais eficaz do
que educar e compartilhar valores sociais em lugar do reforço às instituições
sociais partilhadas e compartilhadas pela sociedade.
Assim, pretendem substituir a família, a igreja, as normas morais, e os
costumes tradicionais por regras legais que adotam punições draconianas tão
severas quanto sejam as ofensas praticadas contra minorias sociais. As minorias
seriam os alvos a serem contemplados pela expectativa de proteção oferecida
pela nova pedagogia da dor.
Assim, pune-se o agressor homofóbico, o agressor machista, o agressor
jornalista, o agressor pedófilo, o agressor motorista, o agressor antissocial
de todo o gênero. Sumariamente.
Escolheu-se a punição em lugar do reforço social para enquadrar os
comportamentos antissociais por que nas mentes autoritárias existe apenas
alternativa da imposição de sua vontade e comportamento padronizado como única
alternativa para enquadrar o diferente, o divergente e o excludente nas
expectativas de uma sociedade monolítica, indiferenciada, do pensamento único
hegemônico padronizado.
Todo e qualquer desvio de comportamento é percebido como uma grave ameaça
social, como uma doença crônica e execrável, intolerável, inaceitável, por isso
deve ser eliminao sem dar chance para recuperação, tratamento, reeducação.
Apenas a punição é suficiente para estes casos.
As expectativas dessa corrente é a de um mundo sem mudanças sociais, sem
conflitos, sem diferenças, sem tolerância. São autoritários e autossuficientes
em sua sabedoria absoluta, não conseguem relativizar nem compartilhar valores
sociais em sua clausura mental e intelectual. Acreditam-se portadores da
verdade única. Nem se quer cogitam de alternativas de soluções para a
sociedade.
Estes arautos da verdade espalham o seu evangelho da idéia utópica perfeita de
uma sociedade perfeita sem nenhuma dúvida de que estão fazendo o melhor, por
isso acreditam que as pessoas que discordam deles apenas ignoram a verdade, e
não sabem o que é melhor para elas, por isso precisam tutelar toda a sociedade
ignorante e mal informada, manipulada e alienada.
Não sabemos como descobriram estas verdades em que acreditam, mas sabemos que
não têm autocensura, altercensura, nem autocrítica ou altercrítica. Tal a
certeza de suas convicções, irrefutáveis, tão certas que não buscam justificá-las,
pois são verdades autoevidentes, tão claras e tão caras para estes arautos do
novo –mundo-perfeito.
Acreditam que se eles não existissem o mundo já estaria afundado no caos mais
completo. A sua missão de redenção do mundo justifica-se de qualquer falha, ou
ato não ortodoxo, até mesmo atos extralegais e antiéticos, claro, dentro de
suas éticas restritas e fechadas.
Em sua trajetória revolucionária, revisionista e renovadora da sociedade
precisam agir rápido e sem a cautela de outros momentos, pois são os profetas e
guias da humanidade, por que as pessoas que ainda não compreenderam a sua nobre
missão um dia o farão, no futuro, justificadas pela legitimação dos resultados
benéficos, certamente, que advirão para todos os cidadãos e para a sociedade,
que, assim agradecida, seria recompensada pelo sacrifício presente e pelas
incompreensões do presente momento de falsa abstinência da razão.
Estamos nos tempos de uma velha religião chamada pensamento-único onde é
proibida a divergência e a pluralidade. Não existe o multiculturalismo nem a
tolerância contra a verdade original. Sãos os apóstolos e profetas do
vale-tudo, não querem olhar para o passado e a História. Eles estão querendo
reinventar o velho como se fosse o novo. Quem não estuda Filosofia comete e
repete os mesmos erros. Por que não existe nada de novo para a Filosofia já faz
2000 anos...
Entramos na era da intolerância, do pensamento-único, da patrulha-ideológica do
politicamente-correto, do preconceito do preconceito, dos chatos de todo gênero,
ecochatos, homochatos, politochatos, pedochatos. Revolucionários sem causa. Não
há mais revolução sexual a fazer, nem viradas políticas, nada a conquistar ou a
desbravar, acabou-se a era das causas importantes para a humanidade, somente
restaram os revolucionários tardios!
25/09/2013 10h17 - Atualizado em 25/09/2013 10h17
Lei Maria da Penha não reduziu morte de mulheres por violência, diz Ipea
Instituto divulgou dados inéditos sobre violência contra a mulher no país.
Crimes são geralmente praticados por parceiros ou ex-parceiros, diz estudo.
Rosanne D'Agostino Do G1,
em São Paulo
566 comentários
A Lei Maria da Penha, que entrou em vigor em 2006 para combater a violência
contra a mulher, não teve impacto no número de mortes por esse tipo de
agressão, segundo o estudo “Violência contra a mulher: feminicídios no Brasil”,
divulgado nesta quarta-feira (24) pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
(Ipea).
O Ipea apresentou uma nova estimativa sobre mortes de mulheres em razão de
violência doméstica com base em dados do Sistema de Informações sobre
Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde.
saiba mais
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As taxas de mortalidade foram 5,28 por 100 mil mulheres no período 2001 a
2006 (antes da lei) e de 5,22 em 2007 a 2011 (depois da lei), diz o estudo.
Conforme o Ipea, houve apenas um “sutil decréscimo da taxa no ano 2007,
imediatamente após a vigência da lei”, mas depois a taxa voltou a crescer.
O instituto estima que teriam ocorrido no país 5,82 óbitos para cada 100 mil
mulheres entre 2009 e 2011. "Em média ocorrem 5.664 mortes de mulheres por
causas violentas a cada ano, 472 a cada mês, 15,52 a cada dia, ou uma a cada
hora e meia”, diz o estudo.
Taxas de feminicídios por 100
mil mulheres, entre 2009 e 2011 |
|
Nordeste |
6,9 |
Centro-Oeste |
6,86 |
Norte |
6,42 |
Sudeste |
5,14 |
Sul |
5,08 |
Fonte: Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea) |
O feminicídio é o homicídio da mulher por um conflito de gênero, ou seja,
por ser mulher. Os crimes são geralmente praticados por homens, principalmente
parceiros ou ex-parceiros, em situações de abuso familiar, ameaças ou
intimidação, violência sexual, “ou situações nas quais a mulher tem menos poder
ou menos recursos do que o homem”.
Perfil das vítimas
Segundo o estudo do Ipea, mulheres jovens foram as principais vítimas --31% na
faixa etária de 20 a 29 anos e 23% de 30 a 39 anos.
Mais da metade dos óbitos (54%) foi de mulheres de 20 a 39 anos, e a maioria
(31%) ocorreu em via pública, contra 29% em domicílio e 25% em hospital ou
outro estabelecimento de saúde.
A maior parte das vítimas era negra (61%), principalmente nas regiões
Nordeste (87% das mortes de mulheres), Norte (83%) e Centro-Oeste (68%). A
maioria também tinha baixa escolaridade (48% das com 15 ou mais anos de idade
tinham até 8 anos de estudo).
As regiões Nordeste, Centro-Oeste e Norte concentram esse tipo de morte com
taxas de, respectivamente, 6,90, 6,86 e 6,42 óbitos por 100 mil mulheres. Nos
estados, as maiores taxas estão no Espírito Santo (11,24), Bahia (9,08),
Alagoas (8,84), Roraima (8,51) e Pernambuco (7,81). As taxas mais baixas estão
no Piauí (2,71), Santa Catarina (3,28) e São Paulo (3,74).
Ao todo, 50% dos feminicídios envolveram o uso de armas de fogo e 34%, de
instrumento perfurante, cortante ou contundente. Enforcamento ou sufocação foi
registrado em 6% dos óbitos.
Em outros 3% das mortes foram registrados maus-tratos, agressão por meio de
força corporal, força física, violência sexual, negligência, abandono e outras
síndromes, como abuso sexual, crueldade mental e tortura.
“A magnitude dos feminicídios foi elevada em todas as regiões e estados.
(...) Essa situação é preocupante, uma vez que os feminicídios são eventos
completamente evitáveis, que abreviam as vidas de muitas mulheres jovens,
causando perdas inestimáveis, além de consequências potencialmente adversas
para as crianças, para as famílias e para a sociedade”, conclui o estudo.